quarta-feira, 4 de março de 2009

Abestalhada

Abestalhado. [De a-² + besta (ê) + -alhado. ] Adj. Bras. Abobado, imbecil, tolo [q. v.].
(Novo Dicionário Aurélio. 1ª ed. 15 ª reimpressão)
  • Chamam-me muito de boba, pateta, besta, abestalhada, mas não me incomoda. Abestalhada tem, por sinal, um efeito muito mais cômico do que ofensivo. Acredito que pela sonoridade e constituição da palavra.
  • Não pretendo fazer uma análise fonológica, morfológica e etimológica da palavra, até porque eu não teria os conhecimentos necessários; proponho-me a uma análise simplória baseada em impressões pessoais.
  • Em uma primeira análise, eu diria que abestalhada é uma mistura de abestada com atrapalhada; sendo muito mais atrapalhada do que besta. Do termo besta, entende-se por bobo, abobado. E do termo atrapalhada, entende-se por desorientada, estabanada, avoada, anuviada.Anuviada, no caso, está aplicada no sentido de quem está junto às nuvens, assemelhando-se à avoada.
  • Tendo claras estas impressões, a terminação -alhada remeter-se-ia ao adjetivo alada. Pois quem está junto às nuvens, logicamente, tem asas.
  • Poderíamos separar o vocábulo da seguinte forma: a-besta-alhada; que dá a impressão de pessoa besta e avoada. Uma verdadeira besta alada!
  • Vejam só como o sintagma “a besta alada” nos causa uma impressão sonora semelhante à “abestalhada”. Tudo se encaixa, e a besta cria asas.
  • Concluindo meu raciocínio – que desenvolvido todo de impressões pessoais, não poderia terminar de outra forma que não pessoal –, eu sou sim abestalhada, ou antes, sou uma besta alada. E repito, não me incomoda; pelo menos eu tenho asas.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

"As pessoas são mais desonestas para com o seu Deus: Ele não tem o direito de pecar." Nietzsche

As vezes me pego pensando em Deus, e nessas horas questiono se tenho fé em coisa alguma que seja. E se Deus peca, e se Deus erra? E se o escrever certo em linhas tortas, não passa de um erro? Se Deus for como um homem, o que impede-me de desejá-lo, e o que me faz adorá-lo?
Eu não sei se creio em Deus, não sei se tenho fé, não sei se sou feliz. Eu questiono, as coisas mais complexas e as mais simples. E eu vivo, e eu anseio viver.
Eu queria ser Deus, para viver em todas as coisas, estar no ar, ser livre como o vento, entrar nos pulmões dos homens, fazer parte de algo diferente a cada segundo e não ficar presa a uma forma física. Eu queria ser livre, e queria amar a todos sem culpa ou medo. Liberdade pra mim é isso, ser livre de si mesmo.
São aqueles segundos que a gente gostaria de "sumir", digamos assim. Eu os transformei num desejo constante. Eu não quero me prender, a pessoa ou coisa alguma que for, nem que seja a mim mesma.
As vezes eu penso que é resultado de alguma desilusão, mas não, sempre esteve comigo esse desejo; só cresceu ao longo dos anos, talvez pela repressão e frustração toda que eu tive em minha criação, mas já era parte de mim, sempre foi... E é essa parte de mim que me dá vontade de viver, viver, viver... E todo amor que eu tenho na vida, toda paixão que eu tenho pela vida, é por conta disso, desse meu desejo de ser imaterial. Que seja um desejo improvável de se realizar, mas que me mantenha viva... Eu queria voar, até que alguém me disse: "Não seja a folha no vento, seja o vento na folha". E hoje eu sou vento... Quando fecho os olhos e me concentro em mim, quase posso sentir eu me desfazendo no ar, feito fumaça...
Eu quero ser a aurora, quero ser o oceano, quero ser as folhas verdes e as borboletas azuis... Mas quando olho no espelho e vejo o rosto de meu pai e as atitudes que mais desaprovo de minha mãe, me vejo humana... e presa, nessa prisão pérpetua que sou eu. Um eu que nem é tão meu assim, porque eu sou a continuedade de outros. É tão triste ser sólido, feliz é sublimar...

domingo, 20 de janeiro de 2008


HINO DOS MALUCOS

Nós, os malucos, vamos lutar
pra nesse estado continuar
Nunca sensatos nem condizentes
mas parecemos super contentes
Nossos neurônios são esquisitos
por isso estamos sempre aflitos
Vamos incertos pelo caminho
nos comportando estranhos no ninho
Quando a solução se encontra
um maluco é do contra
Mas se vai pro lado errado
um maluco vai do lado
Malucos, a nossa vida é dar bandeira
ligando a luz da cabeceira
se a água pinga na torneira
Malucos, a nossa luta é abstrata
já que afundamos a fragata
mas temos medo de barata
Nós, os malucos, temos um lema:
tudo na vida é um problema
Mas nunca tente nos acalmar
pois um maluco pode surtar
Os nossos planos são absurdos
tipo gritar no ouvido dos surdos
Mas todo mundo que é genial
nunca é descrito como um normal
Quando o papo se esgota
um maluco é poliglota
Mas se todo mundo grita
um maluco se irrita
Malucos, somos iguais na diferença
e todos temos uma crença:
seguir a lei jamais compensa
Malucos, somos a mola desse mundo
mas nunca iremos muito a fundo
nesse dilema tão profundo
autoria:Fernanda Young / Alexandre Machado / Rita Lee / Roberto de Carvalho

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Suposições

"Mullá, qual o significado do destino?"
"Suposições"
"Em que sentido?"
"Você supõe que as coisas vão bem e elas não vão - a isto chama azar. Supõe que as coisas vão mal e elas não vão - a isto chama sorte. Supõe que certas coisas irão ou não acontecer - e na mais absoluta falta de intuição, não sabe o que irá acontecer. Você supõe que o futuro é desconhecido."
"Quando você é surpreendido - a isso chama Destino"


[tradução de Henrique Cukierman e Mônica Udler Cromberg]

  • Suposições, p. 108 in Histórias de Nasrudin; Edições Dervish - 1994

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Tolices gostosas

Eu tenho dois relógios, um com, aproximadamente, um minuto de atraso em relação ao outro. Não sei nem qual está certo ou se ambos estão errados, mas isso de fato não interessa no exato momento; não falo de horas, falo de acasos e superstições.
Não sei também se é bem uma superstição, talvez seja mais para uma crença popular ou sei lá, própria dessas menininhas adolescentes e apaixonadas por todo o novo que encontram no mundo; no estilo daquela brincadeirinha boba de anel de latinha de alumínio, onde a menina recita o alfabeto inteiro atrás da primeira letra do nome de quem a ama. Bobagem, mas uma bobagem gostosa. É bom ser inocente e tolo.
Pois bem, outro dia certa amiga contou-me que sempre que se olha no relógio e os minutos e as horas coincidem num mesmo algarismo alguém está a pensar em você. Achei a estúpida falta de lógica para isso totalmente encantadora e passei a reparar com mais cuidado o que antes eu achava apenas curioso. Ou no máximo, se fosse em noite de lua cheia, comentava como algo sinistro, mas, obviamente, em tom de piada. Nunca havia me passado pela cabeça que uma coisa dessas poderia significar que alguém pensava em mim, talvez porque eu não ache que as pessoas pensem muito em mim, e se pensam, ao certo eu não vou saber quando. Ou será que a orelha realmente coça quando alguém fala mal de nós? Não sei... Espero que não, pois a minha está me matando aqui.
Será mesmo que alguém pensa em mim só pelo fato de serem, por exemplo, 10:10h da manhã? Talvez... Quem sabe?
Mas a questão é, se eu olhasse o relógio de um em um minuto, será que alguém pensaria em mim de uma em uma hora? Ou será que a cada hora uma pessoa diferente pensaria em mim? Lógico que não, seria uma coincidência de minutos e horas forçada, logo, deixaria de ser coincidência.
E é aí que eu quero chegar desde o começo! Olhei agora em meu relógio, agorinha mesmo, e me deparo com um 16:15h. Ai, que raiva fiquei! Lembrei que o outro estava com uma diferença pequena e resolvi olhar as horas nele, nada, 16:17h!
Pois é, tentei enganar o acaso, mas, realmente, não dá!

domingo, 28 de outubro de 2007

Noite sem fim

Desceu a escada, a boca trêmula e os olhos úmidos. Andava cambaleando, não havia em si nem ao menos uma gota de sobriedade. Vestido amarrotado, uma alça caída no ombro e um rasgo de leve na costura da outra. Tirou os saltos, sentou-se no fim da escada. Encosta agora a cabeça na parede, e espera.
Logo surge o sol, junto à consciência de seus atos. Clareia a mente, e traz um pouco de dignidade.
Recorda, lembranças fragmentadas. Cheiro de vinho, gosto de pele e suor. Um sopro na nuca; não, respiração. Não faz muito tempo, ainda sentia o deslize da mão em seu tronco. Um tapa na cara, mas foi para acordar. Náuseas, sufoca as lágrimas e espera. Estava distante de casa, não lembra com que propósito foi parar neste lado da cidade. Uma palavra, que diz? Os lábios se movem, mas o som não se propaga. Chora comedidamente e pede perdão. Seus pecados, abrigo para a solidão. Não é a primeira vez que se submete ao vulgar em busca de afago, não será a última.
O sol forte em seu rosto irrita-lhe os olhos, insuportável. Deita no degrau cobrindo os olhos com o braço e começa a cantarolar uma música possivelmente inventada. Os sapatos em sua mãos acompanhavam o ritmo da música em movimentos circulares.
Abre-se a porta, sai o rapaz. Seus olhos lúcidos refletiam uma mistura de aversão e pena. Pensa em dizer qualquer coisa que fosse, desvia o olhar. Não é covardia, é sensatez. Secamente a manda embora, e volta a entrar. Tranca a porta, e ela ri. Uma risada quase desesperada e sente as pernas lhe falharem ao tentar se levantar. Desiste, volta a sentar-se, e espera. Um pouco de valorização, talvez. Que não seja através de amor, mas pelo menos alguns trocados.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Memória


Amar o perdido

deixa confundido

este coração.


Nada pode o olvido

contra o sem sentido

apelo do Não.


As coisas tangíveis

tornam-se insensíveis à palma da mão


Mas as coisas findas

muito mais que lindas,

essas ficarão.


Carlos Drummond de Andrade